Por: Noeli Santos

De alimento dos fracos à rainha do Brasil, esse tubérculo nativo nacional tem até seu próprio dia de comemoração: 22 de abril, Dia Nacional da Mandioca.

A palavra mandioca deriva de uma lenda Tupi-Guarani. Conta-se que uma menina, de nome Mani, de pele clara e cabelos loiros, muito querida da tribo morreu muito cedo, e do seu túmulo, regado todos os dias pelas lágrimas da mãe, nasceu uma plantinha, que chamaram Mani Oca, Casa da Mani.

Originária da América do Sul, a mandioca (Manihot esculenta Crantz) é o segundo alimento com maior teor energético, ficando apenas atrás do arroz.

Dessa forma, produzida em todo o território nacional, a mandioca adapta-se bem a variados tipos de solo e por ser bem resiliente às secas, é o principal alimento das famílias de área rural em grande parte do país onde há escassez hídrica.

O pão do Brasil

A mandioca é também conhecida por aipim, macaxeira, maniva, maniveira, pão de pobre… Este último, apelido cunhado pelos europeus que aqui chegaram ainda durante a colonização, foi pela falta do pão de trigo, que aqui nestas bandas não se conhecia, pois o trigo aqui não vingava, já a mandioca, crescia majestosa em terras secas e não exigia muita labuta na sua lavoura.

Carentes do pão de trigo e querendo desmerecer a alimentação do indígena, como se a cultura da mandioca fosse primitiva e medíocre, os primeiros colonizadores diziam que quem se alimentava do tubérculo ficava fraco, que não era um alimento nutritivo. Na falta do pão, o europeu foi salvo pela farinha de mandioca. Aprenderam a inserir a farinha em todas as refeições, raspando do prato todo o caldo do repasto.

O indígena ensinou a técnica de fazer a farinha, o beiju, a tapioca… Ensinou a anular o “veneno”, um composto cianogênico, presente em maior quantidade na espécie chamada mandioca brava, que é a mandioca usada para fazer farinha. Essa variedade não pode ser ingerida crua, sem o tratamento adequado, pois pode ser letal para o ser humano, mas inofensiva para os animais.

“Arrancadas as raízes e retirada sua casca, resta uma substância farinácea, leitosa e glutinosa, que é reduzida a pequenos pedaços, num ralador giratório, recoberto com uma chapa de cobre perfurado, caindo tudo num cocho… É então posta a secar em panelas rasas, a fogo brando, até que se evapore toda a umidade, assemelhando-se, então, a uma substância granulada e seca, pronta para ser usada.” (Lindley, 1969, p. 52)

A expansão da mandioca

Dizem que quando sai quente do tacho, tem gosto de miolo de pão quentinho, daí mais uma alcunha para a rainha: Pão do Brasil.

E a mandioca não alimentou só os habitantes das terras da América do Sul, como conta Jaime Rodrigues em seu artigo: “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma história da mandioca em perspectiva atlântica”. Foi além-mar, atravessou, portanto, o Atlântico, nos navios que iam buscar escravos na África. Pois sendo um mantimento seco, a farinha não estragava nas longas viagens.

Luís da Câmara Cascudo, antropólogo e pesquisador da História da Alimentação no Brasil, também relata:

“Os navios que iam comprar ‘as peças da Guiné’ levavam o fumo em rolo para troca e nos porões, bruacas e surrões de farinha para o sustento dos futuros escravos embarcados. Antes de pisar terra do Brasil vinham comendo mandioca.” (Cascudo, 2011, p. 92)

Os cronistas da colonização, entre eles Pero Vaz de Caminha, já faziam elogios à mandioca. Diziam ser ela o Pão da Terra em sua legitimidade funcional. Saboroso, de fácil digestão e substancial.

Perfil nutricional

Além de ser fonte de carboidratos, a mandioca fornece vitaminas, ferro, fósforo, potássio e outros sais minerais. Não contém glúten, sendo segura para celíacos e alérgicos. Ajuda na produção de serotonina, uma substância responsável pelo bem-estar. Por ser rica em fibras, ajuda no bom funcionamento do intestino.

Nas variedades biofortificadas, a mandioca apresenta altos teores de carotenoides, entre eles o betacaroteno e o licopeno, que são substâncias antioxidantes e precursores de vitaminas, principalmente a vitamina A, cuja deficiência provoca anemias e problemas de visão.

A mandioca também é muito utilizada na indústria têxtil e farmacêutica. A panificação também tem se aproveitado dos benefícios da mandioca, por ser rica em amido e não conter glúten.

Por todos os seus benefícios, a ONU – Organização das Nações Unidas, elegeu a mandioca como alimento do século 21. Sendo assim, com sua rica história e importância, não é por pouco que a mandioca merece o título de rainha do Brasil.

Receita de goma de tapioca

Ingredientes

  • 2 xícaras de chá de polvilho doce
  • Água o quanto baste para cobrir o polvilho

Modo de preparo

1 – Em primeiro lugar, comece deixando o polvilho doce de molho em água na geladeira por 1 noite. O amido vai sedimentar no fundo da tigela.

2 – No outro dia, escorra a água e coloque mais 1 colher de sopa de polvilho seco na tigela. Essa colher de polvilho vai absorver toda a umidade que restou.

3 – Em terceiro lugar, com uma colher, desmanche o bloco de polvilho em pedaços pequenos.

4 – Agora desmanche ainda mais com a mão.

5 – Em seguida, passe pela peneira com a ajuda das costas de uma colher, ou com os dedos mesmo.

6 – Sua goma de tapioca está pronta! É só guardar na geladeira num recipiente tampado.

7 – Por fim, quando for preparar a tapioca, polvilhe a goma na frigideira, coloque o recheio desejado e dobre. Está pronta a sua tapioca!

Referências

  • CASCUDO, Luís da Câmara. História da Alimentação no Brasil. São Paulo: Global, 2011;
  • LINDLEY, Thomas. Narrativa de uma viagem ao Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1969;
  • RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem: uma história da mandioca em perspectiva atlântica.” Revista Brasileira de História, v. 37, n. 75, p. 69-95.

 

Noeli Santos é graduada em História, estudante de Nutrição e idealizadora do Alergiazero.blog.


“Todas as informações e opiniões contidas neste artigo são de total responsabilidade de seu autor e não expressam, necessariamente, as posições do Gastronomia.com.br.”

 

Créditos – Destaque: Noeli Santos